Lendo os blogs sobre finanças pessoais durante esse fim de semana, encontrei um
post do amigo Hotmar que cita um texto do Informativo de julho de 2008 do INI (Instituto Nacional de Investidores) respondendo à seguinte dúvida: tendo um capital X, vale mais a pena investir tudo de vez (Lump Sum Investing) ou dividir o capital e fazer aplicações períodicas (Dollar Cost Averaging) ?
O texto sobre o assunto que consta no Informativo, que você pode ler
aqui (pg. 6 e ss.) é, a meu ver, ao contrário do que acha o colega Hotmar,
péssimo. O autor utiliza como base para a sua argumentação o comportamento de apenas 2 anos do mercado acionário brasileiro e, muito pior, apenas 1 ação (Natura). Como a mesma caiu durante esse tempo, o autor conclui que é melhor o Dollar Cost Averaring (DCA) ao invés do Lump Sum Investing (LSI). Mais a frente ele compara com mais algumas ações mas muda a premissa, pois compara com o investidor que comprou no fundo e no topo ao invés de comparar com aquele que comprou no primeiro dia (LSI).
Resumindo, a argumentação do autor é a seguinte:
- De 2006 a 2008 ao se investir na Natura valeu mais a pena o DCA do que o LSI.
- De 2006 a 2008, ao se investir em outras ações, o método DCA teve um retorno maior do que quem investiu no topo e menor do que quem investiu no fundo (óbvio, eu sei, mas o texto gastou duas páginas explicando isso)
- Logo, investir em DCA vale mais a pena do que o LSI.
Ou seja, o raciocínio não faz o menor sentido (a conclusão obviamente não deriva das premissas) e eu perdi 15 min de minha vida lendo esse informativo inútil, mas vamos adiante...
Em resposta ao post do colega Hotmar, o excelentíssimo blog Investimento e Finanças fez excelentes ponderações sobre o tema
aqui, usando o seguinte raciocínio:
- Se a bolsa cair, valerá mais a pena investir no método DCA.
- Se a bolsa subir, valerá mais a pena investir no método LSI.
- O comportamento futuro da bolsa é notadamente imprevisível.
- Logo, deve-se "diversificar o método" e aplicar metade no método DCA e metade no método LSI.
No parágrafo seguinte, o autor faz outra argumentação interessante, qual seja:
- Historicamente, o LSI valeu mais a pena em 66% dos casos.
- Como o rendimento passado não é indicativo do rendimento futuro, essa informação é irrelevante.
- Logo, deve-se manter a diversificação do método no argumento anterior.
Argumentos muitíssimo mais elegantes e dignos de análise.
O problema com a argumentação do colega Inv. e Fin. reside no item 3:
O comportamento futuro da bolsa é notadamente imprevisível.
Quando lidamos com situações que envolvem o ser humano é natural chegarmos a soluções que são meramente probabilísticas ao invés de algo completamente definido. Tal fato deriva da enorme complexidade que envolve a ação humana. No caso de uma Bolsa de Valores essa questão é magnificada, uma vez que envolve comportamentos de milhões de pessoas.
Toda essa discussão metodológica/filosófica no parágrafo anterior serve para atentar ao leitor que, apesar de imprevisível, o comportamento da bolsa não é completamente randômico. Um conhecimento fundamental, apesar de elementar, é de que
a expectativa de qualquer Bolsa de Valores no longo prazo é de alta. Isso ocorre pelo contínuo aumento, em média, da eficiência das empresas em gerar lucros aos investidores derivado da própria capacidade criativa do ser humano e da constante adição de capital ao mercado através de dividendos e outros mecanismos. Tal conhecimento elementar gera uma conclusão, também elementar, porém verdadeiramente útil ao investidor:
Em média, vale mais a pena investir na bolsa hoje do que amanhã. Obviamente não sabemos como será o comportamento da bolsa no dia seguinte, no mês seguinte ou até mesmo nos próximos 10 anos... mas sabemos que, como a expectativa de retorno é positiva, existe uma chance maior da bolsa subir do que descer. Caso isso não fosse verdade, a expectativa de retorno seria 0 ou até mesmo negativa.
Podemos fazer uma analogia com um casino às avessas. Enquanto no casino sabemos que, a cada rodada, nossa chance de ganharmos é menor do que 50% (caso contrário o casino não obteria lucro), na bolsa de valores a nossa chance diária de termos um retorno positivo é maior que 50%.
Portanto,
para o investidor sempre valerá a pena investir todo o capital disponível de vez (Lump Sum Investing) do que realizar aplicações periódicas. Tal estratégia é comprovada pela história: em 66% dos casos o uso do LSI trouxe ao investidor um retorno superior do que o DCA.
O blog Investimento e Finanças rebate o fato histórico alegando que:
Como o rendimento passado não é indicativo do rendimento futuro, essa informação é irrelevante.
A informação não é irrelevante, pois sabemos que o rendimento passado da bolsa não foi algo aleatório, ele foi fruto do crescimento natural das empresas e dos lucros delas. Negar a utilidade da história, nesse caso, é forçosamente negar que a bolsa possui um retorno esperado positivo (já que o retorno passado não é indicativo de nada), o que definitivamente não é razoável.
O que fiz nesse artigo não foi muito além de ter reinventado a roda: o assunto já foi bastante estudado lá fora e a conclusão foi sempre a mesma: para o investidor, o Lump Sum Investing é, em média, mais rentável que o Dollar Cost Averaging¹. O motivo de muitos investidores persistirem no DCA reside em razões puramente psicológicas: utilizando o DCA, se a bolsa cair, ele vai ficar feliz já que estará comprando na baixa; se subir, ele vai ficar feliz porque seu portfolio subiu de valor. Uma verdadeira relação "win-win" psicológica. No entanto, cabe a mim ressaltar o óbvio: a função do seu portfolio não é te fazer feliz nem evitar de te trazer sofrimento: é trazer um retorno X a um risco Y. O DCA diminui o retorno sem diminuir o risco e, portanto, é inútil e não deve ser utilizado em hipótese alguma ao investidor minimamente racional.
Boa semana a todos!
--------------------------------
¹ “Our results strongly imply that the additional cost and effort associated with Dollar Cost Averaging cannot be justified for any investor, regardless of degree of risk aversion. With the possible exception of its promoters, nobody gains from Dollar Cost Averaging.”“Nobody Gains from Dollar Cost Averaging: Analytical, Numerical, and Empirical Results,” Financial Services Review, 2(1) 1993, pp. 51-61.